Tarifaço: Lula assume embate político enquanto Alckmin negocia

Enquanto a diplomacia brasileira segue no caminho da sobriedade e da negociação com os Estados Unidos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva toma um caminho diverso dessa orientação. O governo entendeu que a briga com Donald Trump tem grande potencial de render dividendos políticos ao petista.
Lula adota uma posição enfática na defesa da soberania brasileira, em contraste com o apoio dado ao presidente americano feita pelos adversários mais radicais, liderados pelo presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ). A estratégia de deixar com o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB-SP) a tarefa de conduzir o diálogo liberou Lula para trabalhar sua imagem como líder político, tanto internamente quanto na esfera internacional.
O repertório explorado pelo presidente faz contraponto em relação às tarifas impostas e outras exigências de Trump. Lula também apontas as críticas para os movimentos de Eduardo Bolsonaro, classificados como “servis” aos interesses dos Estados Unidos. Abaixo outros aspectos abordados por Lula em sua estratégia para lidar com a crise.
“Altivez”
A imagem de “altivez que Lula pretende consolidar contrasta também com o desastrado posicionamento de políticos da direita, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) que antes de puxar um diálogo com setores econômicos, buscou culpar Lula pelas ameaças de Trump. “Lula colocou sua ideologia acima da economia, e esse é o resultado”, escreveu o governador, nas redes sociais, assim que Trump divulgou sua carta com ameaças direcionadas ao Brasil.
“Imperador do mundo”
Nesta quinta-feira, 17, em entrevista à CNN, Lula disse que, se Trump fosse brasileiro, “ele também seria julgado”, referindo-se à invasão do Capitólio e comparando o episódio à tentativa de golpe no Brasil, que culminou nos ataques do 8 de Janeiro de 2023. Além disso, disse que o presidente americano não foi eleito para ser o “imperador do mundo”, o que motivou resposta da Casa Branca.
Imposto para as digitais
Ao participar também nesta quinta do 60º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), o petista centrou fogo em um ponto crucial: a associação da direita e de Trump com as empresas de tecnologia. “Não aceitamos que ninguém se meta nos nossos assuntos internos. Vamos responder como democratas: cobrando imposto das empresas americanas digitais”, disse o presidente. “Não é agora que vou aceitar ordem de gringo. O mundo precisa saber que este país é soberano porque o povo tem orgulho.”
“Chantagem”
Lula manteve o tom elevado à noite em pronunciamento feito em rede nacional. Chamou de “chantagem inaceitável” as atitudes de Trump e disse que “só uma pátria soberana” é capaz de gerar empregos, combater as desigualdades, garantir saúde e educação, promover o desenvolvimento sustentável e criar as oportunidades que as pessoas precisam para crescer na vida. Fez também referência direta aos adversários que se alinham a Trump: “Minha indignação é ainda maior por saber que esse ataque ao Brasil tem o apoio de alguns políticos brasileiros. São verdadeiros traidores da pátria. Apostam no quanto pior, melhor. Não se importam com a economia do país e os danos causados ao nosso povo.”
Sem conflito
No Itamaraty, a postura de Lula não é vista como conflitante. Na avalição de fontes do Itamaraty, não há um contraste nocivo entre o discurso adotado pelo petista e a posição do órgão de negociar até que se esgotem todas as possibilidades de diálogo. “As negociações continuam ocorrendo normalmente”, disse um diplomata. “É natural que Lula, como líder político, fale sobre cenários futuros e isso não é uma coisa fora do normal. Já o trabalho da diplomacia é feito no bastidor. O líder político tem o seu registro e pode mandar o recado que ele acha que deve mandar, em qualquer momento. As coisas não se confundem. São registros diferentes. Agora, é importante ressaltar que há um ponto em comum. Tanto a diplomacia, quanto o presidente, expressam a ideia de que a democracia brasileira não tá na mesa de negociação”, concluiu