Morta por ser lésbica: Um dossiê inédito sobre o lesbocídio no Brasil

ANA MICKAELLY FOI morta a facadas pelo sogro ao pedir a namorada em casamento. No ano passado, as namoradas Meiryhellen Bandeira e Emilly Pereira foram assassinadas a tiros por um vizinho que não aprovava a relação. Luana Barbosa morreu após ter sido espancada por Policiais Militares ao se recusar a ser revistada por homens. Esses são alguns exemplos de crimes de ódio praticados contra lésbicas em todo o Brasil, número que aumenta a cada ano, de acordo com o Dossiê Sobre Lesbocídio que o Núcleo de Inclusão Social da UFRJ divulga nesta quarta-feira.
Em 2014, foram registradas 16 mortes. Em 2017, o número passou para 54 – um aumento de 150% de casos em quatro anos. Só nos dois primeiros meses de 2018, já foram registradas 26 mortes por lesbocídio. Por não haver dados oficiais, os crimes são coletados na mídia e nas redes sociais, o que acaba gerando subnotificação. Os números podem ser ainda maiores que os apresentados.
“A invisibilidade lésbica dentro da sociedade dificulta o desenvolvimento desse mapeamento.”
Assim como o feminicídio, o lesbocídio – termo apresentado pela primeira vez no Brasil na pesquisa – é motivado pela misoginia (ódio a mulheres), porém seguem lógicas diferentes. Enquanto o feminicídio generalizado é, na maior parte das vezes, um crime doméstico, 83% dos crimes contra lésbicas são cometidos por homens que não necessariamente possuem algum tipo de parentesco com a vítima, mas que têm algum tipo de aversão a lésbicas em geral – ou seja, lesbofobia.
Os crimes praticados contra lésbicas também são diferentes dos casos de homofobia praticados contra outros grupos, porque a condição das lésbicas é específica. Os demais grupos também são atacados por não estarem em conformidade com a sociedade, mas as lésbicas ainda sofrem com a carga do machismo. A classificação específica desse tipo de crime é fundamental para que ele possa ser combatido por meio de políticas públicas.
“As mulheres que não correspondem ao que é padronizado, ao que se esperam que elas sigam, são penalizadas. Quando essa mulher é uma lésbica, o que se espera dela é que ela seja discreta, é que ela não solte fogos para declarar o seu amor pela sua esposa. Então, são penalizadas por pessoas que não se sentem bem vivendo próximo a uma lésbica que não se esconde”, explica a pesquisadora Suane Soares, do grupo Lesbocídio – Histórias que ninguém conta, responsável pelo dossiê.
A pesquisa é contínua e apresenta uma demanda ao Estado em busca de solução. “A invisibilidade lésbica dentro da sociedade dificulta o desenvolvimento desse mapeamento. A pesquisa busca criar um espaço de denúncia”, explica a pesquisadora Milena Peres.