JORNALISTA INDAGA: FLÁVIO BOLSONARO É UM PARANOICO OU UM MISTIFICADOR?

7 de maio de 2019 489
"Cientistas brasileiros decifraram crise ambiental, 
mas primeiro filho só enxerga conspirações"
A contribuição de pesquisadores brasileiros para as tentativas de compreender a crise ambiental do século 21 deveria ser motivo de orgulho para todos nós. Peço licença ao leitor para citar três casos exemplares, embora a lista completa de gente fazendo trabalho de alto nível no país sobre o tema seja muito maior.
 
Começo com o físico Paulo Artaxo, da USP, figurinha carimbada entre o seleto grupo de 1% de cientistas mais citados do planeta (em geral, quanto mais influentes são os estudos feitos por um pesquisador, mais eles são citados por outros cientistas em seus próprios trabalhos).
 
Artaxo ajudou a desvendar, p. ex., os detalhes da formação de nuvens de chuva na Amazônia. O trabalho é cheio de nuances, mas o resumo da ópera está claríssimo: as partículas de matéria orgânica que a mata libera na atmosfera são as principais sementes do aguaceiro que costuma cair na região durante a estação chuvosa.

Gotículas de água e cristais de gelo vão se agregando em torno dessas partículas e começam a formar nuvens, as quais, é claro, podem despejar chuva sobre a floresta. 
 
Enquanto este se destaca no meio científico...

Queimadas em grande escala alteram esse padrão porque as partículas de fuligem competem com as produzidas pelas árvores. 

O vapor d’água, portanto, acaba se condensando de forma mais dispersa, dificultando a formação de nuvens de chuva. Noutras palavras, queimadas tendem a produzir seca.

Tudo isso foi publicado nas principais revistas especializadas do mundo, como aScience e a Nature

O mesmo vale, aliás, para os trabalhos do climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. 

Nobre foi um dos responsáveis por identificar a dinâmica perversa que tem se instaurado na Amazônia justamente por causa das secas prolongadas –em parte por causa das queimadas, em parte por conta do aquecimento global.
 
Se o processo continuar se agravando, Nobre e seus colaboradores estimam que boa parte da Amazônia vai virar savana –uma área empobrecida de vegetação aberta. E isso terá impactos sobre todo o clima da América do Sul, já que, de novo, a chuva produzida pela mata é exportada para boa parte do continente. 
 
...este se destaca noutros meios e por outros meios.

Outro peso-pesado da pesquisa, o biólogo Mauro Galetti Rodrigues, da Unesp de Rio Claro (SP), tem coordenado estudos que ajudam a entender o fenômeno dadesfaunação – ou seja, o sumiço da fauna mesmo em áreas de floresta que continuam de pé, um problema particularmente agudo na mata atlântica por causa dos séculos de caça.

Sem os bichos de grande e médio porte, indicam os dados, tais matas tendem a virar zumbis, já que não haverá mais quem carregue sementes e ajude as árvores a se reproduzirem.

Repito: tudo isso é conhecimento sólido, chancelado pelos maiores cientistas do mundo. Mas não é o suficiente, ao que parece, para um dos atuais primeiros-filhos, o senador Flávio Bolsonaro, e seu colega de Senado, Marcio Bittar.
 
Em artigo no site Congresso em Foco (vide aqui), os dois negam que o aquecimento global seja causado pelo homem, dizem que a crise da biodiversidade é balela e que florestas não geram chuva. 
 
 
Afirmam ainda que o planeta está esfriando (embora nove dos dez anos mais quentes de todos os tempos tenham acontecido neste século). É tudo intriga da “ideologia verde, refúgio de esquerdistas”, bradam eles.

Como diria Monteiro Lobato, um raciocínio desses só pode advir de paranoia ou de mistificação. Qualquer que seja a opção correta, estamos em péssimos lençóis. (por Reinaldo José Lopes, jornalista especializado em biologia e arqueologia)
 
A VISÃO DEMOCRÁTICA (POR CELSO LUNGARETTI )