TRUMP DÁ A DICA PARA QUEM PRETENDE INGRESSAR NO REINO DOS BILIONÁRIOS: "DELATAI-VOS UNS AOS OUTROS".
A informação é do Jamil Chade e está no UOL Notícias:
"O governo de Donald Trump iniciou uma campanha para incentivar estadunidenses e estrangeiros que estejam vivendo de forma regular nos EUA a denunciar vizinhos, companheiros de trabalho ou qualquer imigrante que não esteja com seus documentos em dia.
Na página oficial da Casa Branca, um cartaz foi postado mostrando o personagem Tio Sam (...) pregando um anúncio sobre como delatar seu vizinho.
Ajude seu país e a si mesmo, diz o pôster. 'Delate todos os invasores estrangeiros', completa a mensagem, que traz ainda um telefone para onde a pessoa pode ligar com as informações".
Só faltou mesmo o valor da recompensa para quem dedar o imigrante ilegal. conforme aparecia nos cartazes com fotos de bandidos procurados do velho Oeste.
Nos tempos bíblicos, a recompensa não era lá grande coisa:
"Então Judas Iscariotes, um dos doze discípulos, foi ter com os principais sacerdotes e perguntou: 'Quanto estão dispostos a pagar-me para vos entregar Jesus?' Deram-lhe trinta moedas de prata. A partir dali, Judas mantinha-se atento, à espera de ocasião para entregar Jesus" (Mateus, 26:14).
Suponho que o Trump pague mais do que o Caifás para quem for tão abjeto a ponto de degradar-se a esse ponto...
Às vezes até me causa estranheza a lembrança de que um dia minha foto e meu nome apareceram num dos cinco cartazes de procurados, cada um com oito militantes, que a ditadura militar fez afixarem em locais públicos.
O dinheiro dos contribuintes era dilapidado acusando-me de ser um dos "terroristas assassinos" que teriam "assassinado e roubado vários pais de família". Logo eu, que nunca tirei sangue de ser humano nenhum e na guerrilha atuava como comandante de Inteligência e não como participante de ações armadas!
[Faço questão, contudo, de deixar claro que sempre tive o maior respeito e admiração pelos companheiros que arriscavam a vida na luta contra a tirania. Se tivesse recebido tal atribuição, cumpriria meu dever de militante tão bem quanto pudesse. O que eu repudio é um governo ilegal e ilegítimo ter-me imputado crimes que não cometi, mesmo estando ciente de que minha função era outra.]
Eu saíra de casa alguns meses antes, quando tinha caído um companheiro que conhecia a escola onde eu estudava. Ele, contudo, resistiu bravamente durante muito tempo.
Pensei até que estivesse a salvo, mas, depois do drama que havia sido, para meus pais, verem o filho único ir "correr mundo, correr perigo"(saudoso Torquato Neto!), resolvi assumir a clandestinidade, estivesse ou não sendo procurado.
E o meu temor inicial acabou mesmo se concretizando, ainda que com substancial atraso. Foram no colégio MMDC, encontraram a foto que utilizariam no cartaz e também o endereço dos meus pais, indo em seguida aporrinhá-los em plena madrugada.
E, numa manhã em meados de 1969, ao passar pela banca de jornais a caminho da padaria, vi um jornal pendurado anunciando o lançamento daquela série de cartazes.
Meu nome e foto apareciam, assim como os do companheiro José Raimundo da Costa, outro membro do Comando Estadual de Sâo Paulo. Por medida de economia, alugáramos juntos um apê na Barra Funda e tinha sido com minha identidade real que eu fechara o contrato.
Ambos fizemos as malas rapidamente, deixando muita coisa para trás, e nos colocamos a salvo. Nunca soubemos se alguém alertou ou não a repressão. Enviamos uma carta ao proprietário do imóvel, pagando um aluguel extra e nos desculpando pelo abandono inesperado.
Os tais cartazes nos assustaram a princípio, mas ninguém da VPR acabou preso por causa deles, embora estivessem espalhados por estações rodoviárias e ferroviárias, repartições públicas, estabelecimentos comerciais, bancos, etc. Passamos a chamá-los zombeteiramente de "galeria dos imortais da Oban"(Operação Bandeirantes).
Certa vez, sentei-me à mesa num restaurante e, ao olhar para a parede ao lado, lá estava exatamente o cartaz no qual eu aparecia. Avaliei a situação e conclui que ninguém mais prestava atenção naquele lixo. Tinha se tornado parte da paisagem. Então, o melhor era eu manter a calma e só ir embora depois de fazer a minha refeição; caso contrário, aí sim alguém poderia estranhar.
Logo no início, contudo, eu ainda receava ser reconhecido e, obrigado a viajar para o Rio de Janeiro de ônibus, tendo como único documento um título eleitoral preenchido à mão (facílimo de falsificar, portanto), aceitei o oferecimento de uma aliada ligada ao teatro, que me deu um banho de loja, clareou e encaracolou meu cabelo, fez-me comprar um óculos com armação de tartaruga, mudou todo meu visual.
Viajei vestido como um jovem dândi, com gravata chique, blazer príncipe de Gales tendo emblema de grifo no bolso, óculos me fazendo parecer mais novinho ainda... Coerente com tal figura, eu me apresentava como um inofensivo professor catarinense.
Sobrevivi um ano na clandestinidade (o que não era para qualquer um no auge dos anos Médici) e acabei caindo por confiar demais num aliado de quem me separei lá pelas 23h00 de um dia para reencontrar às 6h45 da manhã seguinte.
Subestimei a possibilidade de, nesse curto intervalo, ele chegar em casa, ser preso, levado ao DOI-Codi da Tijuca, tomado uns cascudos e estar pronto para me apontar aos agentes no ponto que tínhamos marcado.
Curioso é o fato de, mesmo tendo esses episódios no meu passado, a primeira coisa que sempre me vem à mente, ao ouvir algo sobre delações partidas de pessoas comuns, é o trecho do livro 1984 de George Orwell, no qual um menino da juventude stalinista entrega o pai que, dormindo, gritara "Abaixo o Grande Irmão!"... (por Celso Lungaretti)
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