SEGUINDO A HISTÓRIA

5 de maio de 2018 506

Conheci-o no final da década de setenta ou no início de oitenta. Naquela época, além de dar aula no SESI, era encarregada do Posto Cultural do MOBRAL, que tinha à frente a profa. Maria de Lourdes Torres Potenza.  Dentre as atividades sugeridas pela coordenação estadual, com o propósito de atrair novos alunos para a alfabetização, estava a de realizar shows e festivais sertanejos. Logo me aproximei de alguns trios, duplas e cantores da cidade, como “Os Três Diamantes” – saudade sempre de meu inesquecível amigo Vail Secco -, Joaninha que era toda ternura... Através deles, organizamos diversas atividades nesse gênero musical, chegando à fundação da Associação Jundiaiense de Música Sertaneja. Perdoem-me os que não cito.
Era um trabalho que me causava agrado. Possibilitava-me estar em núcleos de submoradia, conviver com sua gente e conhecer seus dons e manifestações culturais. Aprendi muito, desde aquela época, com esse povo que resiste, insiste e não perde o aconchego.
O moço, sobre quem escrevo, surgiu na sede do MOBRAL, próxima ao Grêmio CP, interessado em se inserir no projeto, junto com a esposa. Mostrou-me suas composições, cantou e se achegou. Nos festivais, ao não ser classificado, ficava bravo, porém retornava no dia seguinte. Conseguiu, por iniciativa própria, gravar dois pequenos discos e, não faz muito, apresentou-me um CD de sua autoria. 
Algumas pessoas não desaparecem, ressurgem em nossas proximidades. É o caso dele. 
Mais tarde, a esposa e ele se separaram e, ao não encontrar alguém para recuperar a dupla, passou a cantar sozinho.  Trinta e poucos anos transcorreram e nesse tempo todo foram poucos os palcos com aplausos. Não teve condições de aperfeiçoar o canto e o instrumento musical. Não conseguiu como desejava, fazer sucesso e se firmar. Seus cabelos embranqueceram e o olhar não possui o mesmo brilho de outrora. Vejo-o, contudo, quase todas as manhãs, em direção ao centro da cidade, com o violão ao ombro. Detém-se no espaço que oferece café da manhã a baixo custo. Depois, não sei em que lugar se fixa, para dizer das notas musicais que traz consigo. Segue-o uma senhora de fisionomia cansada, com uma bolsa grande. Penso conter alguns CDs dele. Emocionam-me.
Embora seja história melancólica pelos desapontamentos, há nela uma força maior: o não se perder das cantigas de sua alma.

 

 

 

 

 

MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE -

 Professora e cronista. Coordenadora diocesana da Pastoral da Mulher – Santa Maria Madalena/ Magdala. Jundiaí, Brasil.