OS REVOLUCIONÁRIOS E OS MILITARES BRASILEIROS FORAM EXTRAIR LIÇÕES DE GUERRILHA URBANA DE UM MESMO FILME
Para não cair no ramerrão, vou desta vez aproveitar uma crítica alheia (superlativa!) para dar aos leitores uma ideia da grandeza cinematográfica, histórica e política de A batalha de Argel.
Trata-se de um filme de 1966 que foi, naquele momento, visto com muita atenção pelos líderes esquerdistas que pretendiam lançar aqui a luta urbana; adiante, já proibido pela censura, serviu como referência também para os militares incumbidos de combatê-la, que o assistiram em exibições privadas.
Seria difícil encontrarmos melhor confirmação da fidelidade com que Pontecorvo mostrou um recorte da lendária luta armada anticolonialista da Argélia, mais precisamente o do crescimento da guerrilha urbana em 1957.
Pena que os fardados aparentemente foram alunos mais aplicados:
— enquanto os guerrilheiros brasileiros não alcançamos a vitória, os do norte da África a conquistaram em 1962, com a assinatura de um cessar-fogo, seguido de plebiscitos nos quais o povo dos dois países aprovou a independência argelina;
—já o trecho do filme em que os militares trocam ideias sobre a necessidade de cortar a cabeça da Frente de Libertação Nacional, seguida da intensa e finalmente exitosa caçada ao guerrilheiro Ali La Pointe, encontra paralelo na obsessiva perseguição aos dois Carlos, o Marighella e o Lamarca, igualmente marcada por torturas atrozes.
A reprodução do texto do crítico português Francisco Rocha é também a homenagem que lhe presto pelo 15º aniversário do seu magnífico blog, que nasceu My Thousand Movies e já evoluiu para My Two Thousand Movies (acessem-no aqui).
Ele e eu tivemos a mesma ideia no mesmo mês, agosto de 2008. E, pelo menos no que diz respeito ao cinema, há muitos outros pontos comuns entre nós. (CL)
PONTECORVO FAZ-NOS ENTENDER A PODRIDÃO DA GUERRA.
Um filme comissionado pelo governo argelino, que mostra a revolução argelina dos dois lados. A Legião Francesa tinha deixado o Vietnã derrotada, e tinha algo a provar. Os argelinos procuram a independência, e dá-se o choque.
Os franceses usam a tortura, e os argelinos respondem com o uso de bombas tradicionais. O filme traz um olhar desagradável sobre a guerra, e todos nela envolvidos.
Marco de Gillo Pontecorvo sobre o anticolonialismo, é provavelmente o mais famoso filme sem verdadeiros imitadores (Z e outros thrillers políticos são bem diferentes), em grande parte porque os países coloniais costumavam ser os países financiadores desses filmes. Aqui os financiadores eram o país que lutava pela independência, o que traz um ponto de vista totalmente diferente para o cinema político.
Os argelinos são mesmo o centro das atenções do filme, mas mesmo isto não é o que nos faz simpatizar com eles. Pontecorvo faz-nos entender a podridão da guerra, que nenhum dos lados é inocente, pois os argelinos fazem explodir bombas em cafés que matam civis e os franceses, com a sua tecnologia massiva, também matam civis.
Antes das grandes revoluções serem televisionadas, o cinema político permitia que as grandes populações contemplassem a uma certa distância as maquinações e as consequências das agitações violentas. Em A batalha de Argel, os avanços técnicos permitiram à narrativa fundir-se com a estética documental e formular um novo tipo de realismo.
Pontecorvo mergulha nesta estética, no que pode ser o maior filme sobre a insurreição, perfilando a luta da Argélia pela independência em tal detalhe e agitação que muitas cenas parecem tiradas diretamente de um telejornal da atualidade.
Ele se desliga dos aspectos mais emocionais e adota a tática da câmara no ombro, não apenas para estabelecer o efeito documentário, mas também para fazer sobressair o impacto de cada tiroteio ou explosão como uma experiência profundamente pessoal.
Ação e reação são inevitáveis, assim como a banda sonora memorável de Ennio Morricone, utilizando o mesmo tema para cada um dos lados, é perturbadora. Três nomeações ao Oscar e três prêmios no festival de Veneza, incluindo o Leão de Ouro.
Obs: para acessar os vídeos do PEQUENO FESTIVAL DE
FILMES ANTICOLONIALISTAS, clique nos seus títulos:
Posted by celsolungaretti
MAIS LIDAS
Dólar ronda R$ 5,60 após dados de emprego dos EUA; Ibovespa sobe
Gaeco investiga esquema que movimentou R$ 316 milhões na Novacap
