dalton rosado
O PORQUÊ DA GANA EM ENCARCERAR BATTISTI
Diante da derrocada do capitalismo, modelo social que hoje não se sustenta nem econômica, nem política e (menos ainda!) ecologicamente, a desculpa esfarrapada do pensamento conservador é a agressão aos modelos socialistas vivenciados pela humanidade (cujo pecado, na verdade, foi o de nunca terem conseguido livrar-se das categorias capitalistas que lhe serviram como forma de relação social).
Quer-se a todo custo matar na origem qualquer sentimento humanista que defenda a virtude, como se o seu contrário, ou seja, a miséria social da grande maioria da população mundial, não tivesse origem num modo de relação social segregacionista.
Quer-se fazer com que prevaleça:
— a força da imposição da verticalidade do poder político-estatal;
— a disciplina militarista que obriga ao cumprimento da missão sem questionamento e ainda que vazia de sentido;
— a negação do roubo implícito próprio à reprodução acumulada do valor e expresso da extração de mais-valia;
— a concentração de renda cada vez mais acentuada, e em contraponto à redução mundial de salários e ao desemprego estrutural.
— a negação das evidências do aquecimento global, mesmo que a quase unanimidade dos cientistas o ateste, ou seja, quer-se que o cadáver caiba no ataúde, independentemente do seu tamanho, para que o funeral continue...
Quanta insensatez! E, mesmo assim, ainda conseguem induzir o povo a aceitar tais aberrações!
Tão forte é a positivação histórica dos valores estabelecidos pela ordem econômica que, mesmo diante da falência que se explicita a olhos vistos e por todos os lados, negarmos as categorias capitalistas como forma de relação social é encarado como se estivéssemos tentando revogar a lei da gravidade...
O capitalismo se funda na exploração do trabalho abstrato produtor de valor, entretanto; e, contraditoriamente, agora se nega, em maior parte, esse mesmo trabalho abstrato, prenunciando a fim dessa forma de relação social (conforme previu Marx há 160 anos).
Positiva-se a mercadoria e o mercado como se fosse a primeira fosse algo natural e a segunda, como se fosse esfera sacrossanta de aferição de competência, qualidade e de meritocracia. Na verdade, as duas apenas demonstram a sua capacidade de dar vida e concentrar o capital, além de torná-lo inacessível à maior parte da população.
Elege-se o Estado, mesmo falido, como entidade neutra, acima do bem e do mal, quando na verdade ele existe para a defesa institucional de uma ordem decrépita e opressora, que se dizdemocrática, e ainda se cobra dos explorados exauridos pelo capital a subvenção desse mesmo Estado mediante o pagamento de impostos!!!
Persegue-se Cesare Battisti como se fosse um troféu a ser conquistado no campeonato da iniquidade. O processo que julgou e condenou Cesare Battisti na Itália se deu dentro de uma ofensiva da direita italiana em face da perda do controle sobre a ascensão da luta revolucionária naquele país, tendo sido, portanto, marcado pelo facciosismo político.
Não há dúvidas de que ele é um perseguido político, por mais que as mídias brasileira e italiana queiram colocá-lo no mesmo patamar de charlatães como esse João de Deus e de traficantes assassinos. Neste sentido, é indefensável a declaração do futuro ministro Sérgio Moro, de que confia da justiça italiana.
Mais indefensável ainda é a posição tomada pelo Presidente Temerário, processado por corrupção além de ser o mais rejeitado da história, de extraditar Battisti com urgência a jato e em flagrante identidade com o que vem sendo afirmado por Boçalnaro, o ignaro (afora a possibilidade de estar pavimentando o terreno para um futuro refúgio na Itália, pois seus aliados batalham para pô-lo a salvo dos processos da Lava-Jato mediante sua designação para o posto de embaixador brasileiro naquele país).
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Artifício de satanização que a ditadura militar já utilizava |
A imagem caricata que se quer fazer de Battisti corresponde ao mesmo intuito do que se fez sob a ditadura militar que qualificava os que lutavam contra o regime de arbítrio como subversivos, terroristas e assassinos. A história se repete com novos velhos atores e não é por menos que o presidente eleito faz a apologia do deslustrado torturador Brilhante Ustra.
As amarras institucionais garantem sempre que há que se governar o Estado dentro dos padrões sob os quais ele foi constituído constitucionalmente. A simbiose entre trabalho abstrato, mercadoria, mercado, política e Estado é de tal forma desenvolvida que essas categorias capitalistas se retroalimentam, impedindo qualquer pensar e ação fora dos padrões estabelecidos.
Nega-se a rebeldia, mas se aceita o genocídio mundo afora, desde que praticado pelo Estado. E agora, chega-se ao ponto de engolir a orientação político-exotérica-astrológica de um palpiteiro insano como o filósofo de almanaque Olavo de Carvalho, a disparar sandices como se o Brasil fosse uma república das bananas.
Apesar da falência mundial do liberalismo capitalista, aqui se reavivam teses liberais de subserviência aos interesses do capital internacional. Vão solapar as nossa riquezas materiais em nome de uma pretensa modernidade política de falsos outsiders que apenas reeditam velharias sob novas embalagens, além de incorrerem nas mais patéticas práticas fisiológicas do submundo político brasileiro (que o diga Fabrício Queiroz, o assessor de Flávio Bolsonaro que continua nos devendo explicações sobre suas suspeitíssimas movimentações financeiras).
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"um tipo de ativista que não pode mais existir" |
Na verdade, a facciosa lógica conservadora perdoa os pecados venais ou mortais inerentes à sua manutenção, inclusive a descarada corrupção dos seus serviçais, mas hipocritamente persegue quem vem na contramão dos seus fundamentos; a estes últimos, faz passar por criminosos.
Tal é o grande pecado atribuído a Cesare Battisti: o fato de ele ter representado um tipo de ativista que não pode mais existir.
A busca de sua prisão (ainda que hoje esteja afastado de qualquer atividade política) representa a simbologia de não aceitação de um pensar fora da caixa, e justamente porque tal posição contraria os interesses sistêmicos numa fase de debilidade causada pela insustentabilidade da economia mundial e de sua crise ecológica.
A defesa que fazemos de Cesare Battisti se dá por princípios humanistas e por solidariedade a um companheiro perseguido político que um dia, na juventude, prestou os seus melhores esforços à libertação da humanidade, pagando até hoje um alto preço por tal ousadia. (por Dalton Rosado)
Uma canção que tem tudo a ver com nosso tema. Legendas em espanhol.