Irresponsabilidade política

Respondendo à critica do leitor Alfio Bogdan (Diário, 27/5), sinto dizer-lhe que está redondamente equivocado sobre minha postura política. Passei a revoltar-me não apenas contra o PT, mas também contra os outros partidos que estiveram no poder na última década. Votei no Lula para o primeiro mandato na esperança de que promovesse as reformas estruturais tão sonhadas no tocante educação, saúde, transporte coletivo. Mas minha decepção foi imensa, quando percebi que ele continuou governando conforme o modelo anterior do presidencialismo de cooptação, usando o dinheiro e o poder do Estado para coligações espúrias e comprando os votos de gente carente e desinformada por medidas demagógicas. Uma Nação não se constrói pela caridade pública, mas pela justiça social. É necessário fazer por merecer o que se ganha, fomentando empregos e competência!
Quanto à deposição da Dilma, se o leitor tivesse lido o que escrevi a respeito na época, teria percebido que eu era da turma do "nem, nem": não apenas Dilma, mas também Temer deveria ter sofrido o impeachment, visto que a eleição da Presidente, tanto quanto a do seu Vice, se beneficiou da compra de votos no contexto da corrupção generalizada. Se o clamor popular tivesse conseguido depor os dois e convocado novas eleições gerais, passando a limpo a classe política, não teríamos chegado à crise atual.
O recente caos provocado pela greve dos caminhoneiros está evidenciando o olhar míope e egoísta dos políticos, privilegiando as estradas de rodagem, meio de transporte mais lento, caro, perigoso e extremamente poluente. Os últimos governos que presidiram o Brasil, ao sucatarem as ferrovias, cometeram um crime de incalculáveis conseqüências. Enquanto as nações mais civilizadas há décadas vêm aprimorando o transporte ferroviário, construindo locomotivas cada vez mais velozes, beirando os 500K por hora, para o transporte de pessoas e cargas, o Brasil engatou a marcha à ré, desprezando a evolução tecnológica neste setor vital para a economia de um país imenso como o nosso.
Será que nossos políticos ainda não perceberam que a estrada de ferro é o transporte mais adequado para cobrir as longas distâncias e por usar a eletricidade, que é uma energia nossa, mais limpa e mais econômica? E não faltaram propostas que vinham ao encontro dessa necessidade nacional. Anos atrás, a imprensa noticiou a apresentação de um projeto de "trem-bala" entre São Paulo e Rio de Janeiro, que faria o trajeto entre as duas maiores capitais em apenas duas horas. Tecnologia japonesa, capital internacional, mão de obra brasileira, exigindo apenas dez anos de exploração para recuperar o dinheiro investido. Em Brasília, conforme então vociferado, membros do Congresso Nacional engavetaram o projeto, atendendo ao lobby das companhias de automóveis, de petróleo, de pneus, de autopeças, que se sentiram prejudicadas em seus interesses corporativistas. E o monopólio do petróleo continua prejudicando transportes (marítimo, fluvial, aéreo) e energias alternativas (eólica, solar, atômica).
Mais uma vez se evidência a origem de todos os nossos males: a corrupção dos políticos, que apóiam quem lhes dá dinheiro ou favores por baixo do pano, prejudicando os superiores interesses da maioria do povo. A classe política, fechada num egoísmo imediatista, individual ou de grupos, não se preocupa com o futuro de nossos filhos e netos. Não me venha o leitor Alfio Bogdan me falar de presunção de inocência para poupar políticos indiciados por corrupção ativa ou passiva, num detestável juridiquês que interpreta muito mal nossa Constituição. Ela foi feita para defender os direitos do povo e não os privilégios dos poderosos. Apenas a cumplicidade no mensalão mineiro ou no petrolão petista já é prova suficiente de desonestidade. Não existe crime mais hediondo do que o desvio de dinheiro público, que causa tanto sofrimento, especialmente à camada mais pobre, pela penúria de recursos para saúde, escola, transporte, segurança pública. Cabe perguntar se, quem reelege políticos envoltos no mecanismo da corrupção, é burro ou masoquista!
Salvatore D' Onofrio
Dr. pela USP e Professor Titular pela UNESP
Autor do Dicionário de Cultura Básica (Publit)
Literatura Ocidental e Forma e Sentido do Texto Literário (Ática)
Pensar é preciso e Pesquisando (Editorama)
www.salvatoredonofrio.com.br
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