Mas, as medidas econômicas planejadas dentro do figurino liberal mercantilista mais ortodoxo do ministro da Economia Paulo Guedes, além das contradições ideológicas com o chefe do governo, esbarram também nas conjunturas econômicas endógenas e exógenas.
O modelo econômico industrial brasileiro tem baixa produtividade de mercadorias, por fatores que adiante analisaremos, o que se soma ao quadro de recessão econômica mundial cíclica renitente (com breves e localizados espasmos de oxigenação, entremeados com depressões econômicas cada vez maiores e intensas, que nos atingem de morte).
Isso explica as dificuldades de obtenção de resultados positivos a partir das premissas do ministro Paulo Guedes: elas estão previamente destinadas ao fracasso.
Não nos esqueçamos que, nos dois últimos trimestres, registramos PIB negativos (-0,3 e -0,13, respectivamente), entrando na chamada recessão técnica, enquanto crescia o número de brasileiros abaixo da linha da pobreza (hoje calculado em 13,2 milhões de pessoas).
Tudo indica que a tão esperadacavalaria (os países do G7) não vá aparecer na enésima hora para nos salvar dos ataques dos próprios fundamentos capitalistas em fase de saturação mundial.
Pelo contrário, tal cavalaria é que já está precisando de socorro, e o Brasil será apenas visto pelas grandes (mas já combalidas) potências econômicas como uma nova colônia mercantil a ser saqueada.
Que o digam os bancos internacionais, sempre divulgando balanços nos quais ostentam lucros estratosféricos, embora artificiais e assentados em moedas falsamente valorizadas e em ativos podres...
Que o digam os bancos internacionais, sempre divulgando balanços nos quais ostentam lucros estratosféricos, embora artificiais e assentados em moedas falsamente valorizadas e em ativos podres...
São muitas as contradições endógenas e exógenas, bem como os impasses que nos impelem ao abandono da crença na velha política institucional, agora travestida de nova, como forma de superação dos nossos problemas econômico-sociais.
Isso nos impõe a busca de alternativas fora da lógica da produção de mercadorias e que conflitam com o permanente choque da idiossincrasia do governo brasileiro e seus tão díspares quanto disparatados pensamentos, corporificados num eclético e conflitante elenco que inclui:
— militares estatistas;
— economistas liberais;
— fundamentalistas religiosos com suas visões pré-iluministas sobre direitos humanos e comportamentais;
— profissionais antiecológicos, ligados ao agronegócio;
— diplomata exotérico guiado por astrólogo de almanaque;
— ingerência familiar inoportuna (um corpo de ministros sem pasta) a carimbar, com o beneplácito governamental, quem é leal ou traidor das ideias anti-civilizatórias conhecidas e defendidas por tais príncipesdeslumbrados com o poder;
— um ex-juiz de 1ª instância, que passou a ser impingido propagandisticamente como super-herói de combate à corrupção e recebeu como prêmio por sua flagrante colaboração eleitoral o posto de ministro da Justiça, mas agora teve sua atuação como magistrado desmascarada (quebrou o decoro próprio à magistratura ao partidarizar os seus julgamentos e aparelhar membros do Ministério Público e da Polícia Federal nos processos criminais por ele presididos).
Tudo isso sob a batuta de um governante biruta, com alma de vereador e pretensões de estadista, a ponto de:
— meter pateticamente o nariz nas decisões políticas dos países vizinhos e até nos de além-mar;
— praticar o nepotismo mais descarado nas indicações para cargos estratégicos, chegando ao cúmulo de querer tornar seu inexperiente filho o embaixador brasileiro nos Estados Unidos;
— proibir os seus assessores de pensar e emitir opiniões pessoais, sob pena de serem sumariamente demitidos com a pecha de desleais;
— fazer apologia de torturadores e assassinos de presos políticos indefesos, justificando seu viés totalitário com evocações extemporâneas do perigo vermelho (as bandeiras pretas dos anarquistas e emancipacionistas estão muito mais na moda!);
— evidenciar, nas suas declarações e ações, submissão incondicional aos EUA e seupresidente destrumpelhado;
— não ter o menor pejo em deixar transparecer o seu pensamento misógino, escravista e policialesco (seja agredindo a honra das mulheres; defendendo veladamente o trabalho infantil; elogiando as milícias e condecorando com título honorífico, por seu filho e discípulo, um dos seus membros hoje conhecidos; e defendendo a venda de armas sob o pretexto de sua comercialização controlada);
O conjunto da obra do ex-capitão (que nem o Exército aguentou manter nas suas fileiras!) o leva a já estar sendo considerado mundo afora como o mais perigoso governante anti-ecológico do planeta, jogando por terra os últimos vestígios de nossa outrora afamada boa vontade em assuntos ambientais, bem como da nossa cordialidade racial de país que a todos recebia indiscriminadamente.
O discurso xenofóbico dele contra a possível debandada de hermanos argentinos para o Rio Grande do Sul depois da previsível derrota eleitoral de Maurício Macri e o suposto caos econômico que a volta do kirchnerismo acarretaria, dá bem a ideia de como ele acha que deve tratar os eventuais imigrantes. Aliás, ele tem sido o maior cabo eleitoral contra seu amigo Macri, outro que deve estar se perguntando: Por que não te calas, Bolsonaro?
O Brasil já tem uma realidade naturalmente difícil de ser administrada, justamente por causa de sua formação político-econômico-social colonial elitista e historicamente corrupta, defensora da permanência da mentalidade cartorial burocrática e com níveis de desigualdades sociais que assustam quantos aqui chegam e constatam a existência nababesca da fatia privilegiada da sua população (numericamente em declínio) e o profundo fosso social a separá-la da grande maioria.
Não faz muito tempo que nosso país era qualificado, pejorativamente, de Belíndia, porque uma parte dele tinha padrões de vida social dignos de uma Bélgica e a outra parte, uma miséria comparável à da Índia.
Hoje a comparação com o Brasil ofenderia, isto sim, aos indianos, pois a economia daquele país decolou, já sendo a sétima do mundo em Produto Interno Bruto Nominal (seu PIB vem crescendo, em média, 7% ao ano).
Daria para escrever um tratado sobre os problemas crônicos do Brasil, que não guarda similaridade com outros modelos mundiais; mesmo que tivéssemos um governo competente e probo, ditos problemas não poderiam ser resolvidos se mantidas as premissas pré-existentes.
Precisamos de novos paradigmas, pois a questão não é de escolhermos os governantes certos, mas sim de não termos governante; de nos organizarmos horizontalmente do ponto de vista social; e de superarmos a lógica escravista da vida mercantil em ocas,o da qual somos particularmente vítimas.
Mas, analisemos pontualmente o resultado das contradições próprias ao nosso país e que se avolumam cada vez mais, como resultantes de um governo influenciado por pensamentos díspares entre seus ministros.
Por Dalton Rosado |
Partamos, pois, para o detalhamento de alguns desses aspectos.
(continua)