Em plena crise na segurança, MP pretende gastar meio milhão de reais em comida e eventos

Qual deve ser a prioridade de gastos de uma instituição com tanto prestígio como o Ministério Público do Estado do Acre (MPAC), principalmente em um momento onde o Estado vive uma crise de segurança e os assassinatos se multiplicam diariamente? Gastar mais de meio milhão com eventos e comidas.
Todos os dados da licitação do MPAC em questão estão contidos na Ata de Registro de Preços Nº 001/2018 (PP nº 045/2017SR; Processo nº 5123/2017), cujo objeto é o “Registro de preços para contratação de empresa especializada em serviços de Buffet e locação de espaço físico para atender as demandas em audiências públicas, palestras, MP na Comunidade, congressos, seminários, simpósios, assinatura de atos, solenidades diversas, entrega de títulos e honrarias, posses e demandas eventuais e urgentes”.
Questionado sobre a aplicação dos recursos públicos, a instituição optou apenas pela resposta protocolar e não respondeu ao questionamento sobre se os recursos não seriam mais bem utilizados no combate à ação das facções no Estado (leia nota ao fim da matéria).
Gastos em festa gera revolta
A licitação feita pelo Órgão Ministerial – é assim que designa o MP, foi alvo de severas críticas por parte das pessoas a quem a informação foi repassada, as quais disseram esperar muito mais do órgão, ressaltando não esperar este tipo de ato por parte do “Fiscal da Lei”.
O MP foi questionado especificamente sobre um gasto desta monta e se não seria mais melhor utilizar estes recursos no reforço das promotorias especializadas e no combate ao crescimento das ações das facções nos bairros da capital em busca da redução dos muitos assassinatos registrados neste começo de ano, mas não houve resposta ao questionamento.
Comida cara para os padrões médios
Os gastos do MPAC previstos para comidas são de até oito eventos gastronômicos e cada um destes eventos com até 200 pessoas. As despesas neste tipo de evento vão variar entre R$ 15 mil e R$ 60 mil.
Além disso, a empresa vencedora ainda ‘levou’ a locação do espaço físico para a realização de 15 eventos por outros R$ 60 mil. Este lote de serviços está previsto para custar R$ 194 mil.
Mas o que mais chamou a atenção – e não foi explicado pelo MPAC – foi que o tipo de evento requer um serviço de “buffet” com valores individuais de R$ 75, R$ 80, R$ 90 e até R$ 110. Em um Estado onde a população sofre para conseguir pagar um marmitex de R$ 10, isso foi considerado um acinte.
Gastos com coquetéis e lanches
Mas os eventos previstos – e não descritos na resposta do Órgão Ministerial – não se limitam às comilanças gourmets, mas vão custar outros R$ 190 mil em coquetéis, lanche em intervalo de eventos (coffe break), café da manhã (?) e lanches para o período da tarde (brunch).
Nesta variação de comilança são previstos oito eventos, cada um para 400 pessoas, totalizando um público possível de 3,2 mil pessoas. Mas, além disso, chamam a atenção os valores individuais passíveis de serem gastos, pois o valor por pessoa de cada um destes eventos varia de R$ 50 a R$ 80, praticamente o mesmo preço das refeições a serem pagas no sistema “buffet”.
Em termos de valores normais pagos por qualquer cidadão médio do Acre, notadamente os da capital, estes valores permitiriam alimentar 19 mil pessoas com cada uma recebendo um marmitex normal e de qualidade.
Mamitex a R$25 e R$ 6 mil em buquês de flores
Mas se em alguns itens da licitação o volume de gastos por unidade não é tão expressivo, o item contratado é, no mínimo, estranho. Afinal, qual a utilidade prática de se gastar R$ 6 mil em buquês de flores (R$ 120 cada) e outros R$ 7,5 mil em arranjos florais.
Por outro lado, o MPAC vai pagar R$ 18 por um lanche composto de sanduiche com refriegerante. Contudo, o item com valores individuais mais caro prevê a compra de marmitex a R$ 25,50. As licitações de marmitex variam entre R$ 10 e R$ 15 reais, seja na prefeitura da capital ou órgãos estaduais (como o Corpo de Bombeiros; SRP n° 063/2017: R$ 11,89).
Mesmo questionado especificamente sobre estes valores e qual seria o conteúdo/menu oferecido para justificar tais valores, não houve resposta do “Fiscal da Lei”.
Aluga local e equipamentos separados
Enquanto qualquer acreano, principalmente os rio-branquenses, aluga um local para eventos com todos os apetrechos necessários, de cadeiras, mesas, toalhas e palco, o Ministério Público do Estado do Acre (MPAC) vai contratar tudo separado.
Se no item “1” a empresa ganhou para alugar o local, a mesma empresa vai receber até R$ 45 mil para locar toalhas de mesa, cadeiras de vários modelos e até mesmo os tablados onde os condutores dos trabalhos vão ficar.
Questionamentos encaminhados ao MPAC
Por conta das incongruências com a realidade do Estado e do momento vivido pela sociedade acreana, foi encaminhado um pedido de explicações para o MPAC com as seguintes questões:
1) Qual o tipo de evento justifica 200 refeições com preços variando entre R$ 75 e R$ 110 (principalmente estes) e quais os cardápios a justificar tais preços?
2) Qual a necessidade de locar um espaço para estes eventos alimentícios se já está contratando a alimentação? Não seria mais prático e barato o mesmo restaurante que fornece o alimento fornecer também o local?
3) Quais são os eventos a justificarem os gastos com coquetel e qual o cardápio a justificar valores individuais no mesmo patamar de uma refeição em buffet contratada pelo próprio MPAC?
4) Idem para “Coffe Break”?
5) Que tipo de evento justifica um café da manhã e ainda mais por preço individual equivalente ao preço médio de cinco marmitex? Qual o cardápio?
6) Idem para o “brunch”?
7) Qual o cardápio para justificar um marmitex a R$ 25,50 e qual a justificativa para a quantidade cotada de duas mil unidades?
8) Que tipo de evento justifica o gasto de R$ 13,5 mil em flores e vasos, notadamente buquês?
9) Qual a necessidade de locar um espaço em hotel e ainda ter de locar cadeiras, mesas, tablados e toalhas (R$ 45 mil)?
10) Com base no total dos itens “1” a “6”, da ordem de R$ 511,5 mil e considerando o momento econômico e social vivido pelo Estado, estes recursos não seriam mais bem utilizados no reforço das promotorias especializadas e no combate ao crescimento das ações das facções nos bairros da capital com vista a redução dos muitos assassinatos registrados (30 somente na primeira quinzena)?
MPAC: resposta protocolar não esclarece
Com relação ao Pregão Presencial nº 045/2017 – SRP, o Ministério Público do Estado do Acre informa que o procedimento licitatório obedeceu fielmente a todas as normas correlatas, em especial à Lei 8666/93, Lei nº 10.520/02, Decreto Federal nº 7.892/13, Lei Complementar nº 123/06, e Decretos Estaduais nºs 5.972/10 e 5.967/10, sendo criteriosamente observados os princípios constitucionais que regem a Administração Pública, quais sejam, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, inclusive durante a sessão pública do pregão com a presença de todos os licitantes.
Esclarece, ainda, que pelo Sistema de Registro de Preços regulado pelo Decreto 7.892/13, a Administração não está compelida a adquirir os itens registrados em Ata de Registro de Preços, podendo formalizar, ou não, o instrumento contratual.
Para maiores esclarecimentos, todas as informações atinentes ao pregão estão disponíveis no site do Ministério Público do Estado do Acre e do Tribunal de Contas do Estado do Acre.
Atenciosamente,
Dir. Adm / Dir. Com. do MPAC