Donald Trump canta vitória, mas resultado político do tarifaço ainda é duvidoso

De olho nas eleições de meio de mandato (as “midterm elections”), em 2026, o presidente americano Donald Trump e sua equipe reforçam a narrativa de vitória com a política protecionista desencadeada em janeiro, no início da atual administração. O esforço para garantir o fechamento de pelo menos cinco acordos até o final de julho era tido como determinante para o sucesso da política do tarifaço. Na Casa Branca, acredita-se que a iniciativa de revisar a relação comercial com outros países permitirá gerar resultados positivos na economia até o final do primeiro semestre do ano que vem – com tempo, portanto, para Trump e seus aliados faturarem nas eleições marcadas para o segundo semestre. Só que os efeitos sobre o cenário político não são assim tão certos como se imaginava.
O plano de Trump foi reforçado pelos dados recentes da economia americana. No segundo trimestre, o crescimento do PIB anualizado aponta para 3%, acima das projeções de mercado, de 2,4%. O dinamismo da economia, aliado à imposição de maiores tarifas de importação, não deixa de ser uma entrega importante, alinhada a compromissos de campanha do presidente americano. Porém, em uma análise mais detalhada, é possível notar certa fragilidade dos números, assim como dos resultados práticos dos acordos que sustentam a estratégia. E o principal: a queda de braço com a China, principal alvo da campanha nacionalista de Donald Trump, permanece (e ainda promete longos capítulos). Na noite desta quinta-feira, 31, o presidente americano anunciou a elevação das tarifas para mais uma série de países. O Brasil segue como o mais taxado entre todos. Trump também adiou o início da cobrança para 7 de agosto.
“Na política do gogó, as coisas vão bem”, avalia o economista de um grande fundo americano, que pede anonimato por medo de retaliações. Donald Trump alardeou ter assinado “o maior acordo comercial da história com o Japão” ao mesmo tempo em que comemorou “o maior de todos” os acertos com o Reino Unido. Além disso, celebrou ter chegado a consensos com a União Europeia, o Vietnã e mais cinco economias. “Jogou para plateia ao mesmo tempo que sabia que as tarifas inicialmente anunciadas para vários países não se sustentariam”, diz o economista. “Algum retorno e avanço para os Estados Unidos há, mas está longe de ser tudo o que se alardeia, e ainda há riscos adiante”, emenda.
Até mesmo o tarifaço contra o Brasil veio com ressalvas. A desidratação da medida, com a isenção de cerca de 700 produtos, evita um estrago maior na própria economia americana – vários dos itens excluídos são essenciais para o mercado local, e sobretaxá-los certamente impactaria diretamente nos índices de inflação. A oficialização da medida veio carregada de agressões políticas e acusações contra o governo e o Poder Judiciário do Brasil, incluindo menções a interesses que vão das big techs ao apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
O que sobra?
Tirando a espuma da narrativa criada, ficam cartas de intenções e pouca clareza sobre os resultados que as medidas garantirão. O crescimento da economia americana no segundo trimestre, por exemplo, foi puxado pela queda nas importações e pelo aumento do consumo, que responde por dois terços do resultado do PIB e está sendo sustentado pelo mercado de trabalho aquecido. No trimestre anterior, o movimento de antecipação de importações por parte de empresas americanas para tentar fugir do tarifaço teve efeito inverso ao esperado e contribuiu para a retração de 0,5% na economia. Agora, a baixa nas importações veio acompanhada de menos investimentos e de queda no consumo das empresas.
Por outro lado, com o consumo das famílias e o emprego em alta, o Fed, o banco central de lá, manteve os juros pela quinta vez consecutiva inalterados. O medo do descontrole da inflação colocou o presidente do BC americano, Jerome Powell, em linha de colisão direta com Trump, que vem exigindo redução dos juros. “A situação do Fed é difícil porque a perspectiva é de aceleração da inflação daqui para frente”, diz a diretora de um grande banco estrangeiro. “As tarifas de importação maiores são inflação contratada até julho de 2026 para os americanos”, prossegue ela. A avaliação é que muitas empresas anteciparam a compra de estoques entre março e maio, quando ainda não estavam valendo as tarifas maiores.
Mas a política do tarifaço não garante mais receitas com tarifas e promessas de investimentos? “O problema é que nada está claro. Não tem nada escrito, assinado, ninguém sabe os termos”, diz a diretora. Há expectativas criadas, só que os resultados reais ainda são uma incógnita. Trump anunciou, por exemplo, que o Japão vai investir US$ 550 bilhões nos Estados Unidos, mas não foi detalhado em quanto tempo isso ocorrerá, tampouco se a cifra envolve dinheiro novo ou abarca investimentos já anunciados no início do ano, como o da gigante japonesa Softbank, para impulsionar projetos de IA generativa. Além disso, a situação com a China – o maior problema e origem da atuação trumpista – segue indefinida, apesar da trégua temporária de Washington com Pequim.
Olho nas urnas
Trump tem pressa. Para ele, é importante ter resultados positivos na economia em 2026. As eleições de meio de mandato, em que são escolhidos representantes do Congresso, funcionam como uma espécie de referendo do desempenho do presidente, mostrando o nível de satisfação da população. As eleições servem para renovar um terço do Senado e toda a Câmara dos Representantes. O controle das duas casas do Congresso pode facilitar ou dificultar a vida do ocupante da Casa Branca. Da mesma forma, os resultados são determinantes para a mobilização política em torno da própria sucessão presidencial.