José Chasin (foto), importante filósofo marxista, já vaticinava em 1991 que a esquerda estava morta, fazendo referência à esquerda revolucionária. Infelizmente, ele não viveu o bastante para ver a falência também da centro-esquerda brasileira, em primeiro lugar na versão tucana e depois na lulopetista.
Deve ficar claro que a centro-esquerda nunca foi revolucionária, tampouco reformista, apesar de um pequeno ensaio de grupos minoritários no PT na década de 80. Contudo, a rigor, a dita esquerda nacional sempre foi melhorista: seu objetivo supremo foi trazer melhoras sociais e políticas
Por ser melhorista, tal esquerda jamais conseguiu estabelecer um plano autônomo de desenvolvimento social e econômico para o Brasil. Ficou a reboque das diretrizes da burguesia nacional, basicamente resignando-se a continuar com a estrutura herdada da ditadura militar.
Porque não teve projeto autônomo, mantendo-se a reboque, a centro-esquerda acabou se deteriorando nas insolúveis contradições do capitalismo brasileiro e eclipsou-se após exaurir suas energias, igual uma estrela que colapsa após queimar todo o seu hidrogênio.
No lugar, então, surgiu um buraco negro, a sugar tudo e a todos. Tal buraco negro é o chamado lulopetismo moribundo, o qual não aceita que nada brilhe ao redor, tragando todas as coisas para seu abismo sem fim.
![]() |
Os valorosos manifestantes de junho de 2013 tiveram a centro-esquerda contra si |
Ali, diante da explosão das contradições do país, da rachadura entre o topo e a base, e tendo de escolher um lado, a centro-esquerda assumiu o lado da burguesia, dinamitando sua base popular e abrindo caminho para a ascensão da extrema-direita, que surfou na onda popular de indignação.
A história é conhecida e já foi objeto de artigos meus aqui no blog. Por hoje, basta relembrar que este movimento levou a indignação popular para o campo moralista de luta contra a corrupção, pavimentando o caminho de Bolsonaro, o moralista por excelência.
Desde aquela data, a dita centro-esquerda morreu, limitando-se hoje a espasmos inúteis. E morreu porque já não tem apoio popular: a classe trabalhadora não lhe dá mais ouvidos e outros setores sociais a odeiam.
Não deve ser nossa tarefa tentarmos fazer tal esquerda ressurgir. Ao contrário, diria até que nossa tarefa deveria ser a de fazermos o máximo possível para que ela seja sepultada de vez. Ela não tem mais nada a dizer nem a oferecer.
Não deve ser nossa tarefa tentarmos fazer tal esquerda ressurgir. Ao contrário, diria até que nossa tarefa deveria ser a de fazermos o máximo possível para que ela seja sepultada de vez. Ela não tem mais nada a dizer nem a oferecer.
![]() |
Antiga torturada, ela foi contra o #naovaitercopa e apertou a mão de um delator do Vladimir Herzog |
Qual a força da esquerda de poderia intervir neste processo? Eu diria que quase nenhum. Fracassos de mais de século pesam sobre nossos ombros e a desorganização reina entre nós.
Pior, pouco se sabe exatamente sobre a dinâmica do mundo atual. A maioria das forças de esquerda ainda se guia por teorias erradas, mistificadoras e antirrevolucionárias.
Chegam mesmo a ainda grassar entre nós posições estalinistas ou importadas do establishment do antigo PC soviético, isto quase trinta anos depois do fim da URSS! Isto quando não são guiadas por teorias modistas do liberalismo pós-moderno...
Por isso, acredito que o primeiro passo seja reassumirmos a teoria revolucionária, tomando pé da realidade e compreendendo com exatidão onde estamos, por que, e o que devemos fazer.
Entender a lógica capitalista do século 21 e a especificidade do Brasil é tarefa fundamental para a ação da esquerda.
Chegam mesmo a ainda grassar entre nós posições estalinistas ou importadas do establishment do antigo PC soviético, isto quase trinta anos depois do fim da URSS! Isto quando não são guiadas por teorias modistas do liberalismo pós-moderno...
![]() |
"a esquerda poderá retornar à cena liderando os indignados" |
Entender a lógica capitalista do século 21 e a especificidade do Brasil é tarefa fundamental para a ação da esquerda.
Em paralelo a isto, faz-se necessário analisar criticamente o passado da esquerda e da centro-esquerda, passando a limpo erros e acertos e nos defrontando de fato com o pesado passivo herdado. Só assim será possível falarmos de novo à população.
Este processo deve estar no curto e médio prazo, fase em que não deveria ser nossa preocupação assumir a dianteira em ações políticas ou de mobilização. Melhor ficarmos na retaguarda, apoiando, lateralmente, este ou aquele candidato, esta ou aquela força política, que mais próximo de nossas posições possam estar, sem, contudo, jamais abrirmos mão de nossas posições. Ou seja, ser aliado político, mas manter a independência programática.
No longo prazo, a esquerda poderá retornar à cena, liderando os indignados com uma explicação clara e certa sobre a natureza da crise, sua raiz na exploração capitalista e o caminho revolucionário.
Portanto, a tarefa maior da esquerda no pós-pandemia é se reerguer, superando de vez o passivo da esquerda stalinista e da centro-esquerda nacional, e retornando a compreensão adequada da realidade atual e da saída emancipatória possível para este mundo decadente e desumano. (por David Emanuel de Souza Coelho)
Observação: esta série inclui os posts (clique p/ abrir) O mundo que emergirá da pandemia e O Brasil pós-pandemia.